18/02/2011

Alcestes de Eurípides

A Alceste de Eurípides é a peça mais estúpida que alguma vez li. É sobre Admeto, a quem os deuses permitirão evitar a morte se alguém morrer por ele. Ele tenta convencer os pais, eles recusam-se, mas a sua esposa Alcestes aceita. Admeto não se opõe, deixa que ela morra por ele, passa o resto da peça a chorar até que por fim Hércules trá-la do submundo e tudo fica bem. Sei lá, é justo de quem ama oferecer-se para morrer por quem ama, mas é igualmente justo de quem ama de volta recusar-se a que o outro morra. O que vem daqui apenas os fados o sabem,

Mas nesta peça, desde a soap-opera completa, ao anti-trágico que não consegue ser cómico, à completa previsibilidade e antecipação, ao melodrama, às personagens irremediavelmente tontas, é tudo parvoíce. A única coisa que se aproveita em toda a peça é a fala em que o pai do imbecil do Admeto, Feres, lhe atira as mimalhices à cara e o manda deixar de se comportar como um hipócrita. Assim sendo, vou citá-lo.


FERES
Ó filho, a quem te vanglorias tu de injuriar? A algum lídio ou frígio comprado a dinheiro? Não sabes que sou tessálio, filho de pai tessálio e um homem nascido livre? Exageras na insolência e agrides-me. Não será impunemente que me lanças essas palavras pueris. Gerei-te e criei-te para seres senhor desta casa, mas não é meu dever morrer por ti. Essa é lei que não faz parte da tradição da nossa família, que os pais têm de morrer pelos filhos. Isso não é próprio dos Helenos. Feliz ou desgraçado, a vida é tua. Aquilo que tinhas a receber de mim, já tu o conseguiste. São muitos os súbditos que te obedecem, grande a extensão de terras que te hei-de deixar, muitas jeiras, as mesmas que recebi do meu pai. Portanto, em que te prejudiquei? De que te privo? Não morras por este homem que eu sou, que eu também não morro por ti. Gostas de ver a luz do dia? Não te parece que o teu pai também gosta? A vida é curta, mas doce, enquanto o tempo lá em baixo é longo, imagino. Sem sombra de pudor, lutaste para não morrer e continuas vivo, soubeste escapar ao que estava designado pela fortuna, que a matou a ela. E falas da minha cobardia, tu que és um cobarde, vencido por uma mulher que morreu por ti, um belo jovem? Encontraste foi forma de nunca morrer, esperto, se convenceres sempre a mulher que tiveres a morrer por ti. E agora invectivas os teus amigos por não quererem fazê-lo, quando tu próprio és um cobarde? Cala-te! Nota que se amas a tua vida, todos amam as suas. Em troca dessas injúrias que proferes, hás-de ouvir muitas outras similares e verdadeiras.

Eurípides. Alceste, in Obras Completas I. INCM.

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