22/04/2015

Antíoco IV

A Hildegaarda numa mão. Na outra o Ovídio, mas não os Amores ou as Metamorfoses, — os Fastos: a obra em que os meses do ano, as datas sagradas, são dispostas em dísticos involuntariamente cheios de eros. Aqui aparecem como a patina ou a semelhança de ordem imposta ao caos biforme. Não serve este prelúdio bíblico para reinstaurar a querela e suscitar séculos de filosofia & bem-intencionada concórdia. Serve sim para eu vestir a máscara de prata de Antíoco IV Epífanes, famoso por Vos enxertar os deuses no templo e regar as escadas do Santo dos Santos com o sangue dos sacrifícios. Blasfémia,  dizíeis; sim, talvez, mas também no santo dos santos do meu peito que tu eternamente a ti sagraste desejo plantar a estátua titânica do Pai Tonitruante, anelar pela sua mão a chispar com o fogo da justiça. E no altar que sou para Ti fazer escorrer sacrifícios de sangue. Como tudo o que é humano, não os aceitarás. Não obstante beberás, Jeová, e serás sofregamente um deles. Ensinarás o deserto àqueles a quem apenas no horizonte da nossa morte era concedido cavalgar. Fundir-te-ás com eles até que aprendam também eles como fulminar o ar do deserto numa noite sem chuva. Quanto a ti, aprenderás a amar sem intermediários. Aprenderás e substituirás os teus patriarcas pelo mistério tremendo da paternidade com mortais. O sangue diluído dos deuses engrossar-se-á mais uma vez nas nossas veias, e a salvação tornar-se-á para nós numa coisa supérflua.

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