16/04/2013

Saudades do Strauss

Há muito que me convenci da verdade, em termos absolutos, do atheísmo - ou do seu irmão synónimo, do pantheísmo. Cheguei a uma conclusão relativamente estável em relação às suas proposições, e, ao contrário de tempos passados, deixei de crer na possibilidade (embora sem totalmente a negar, como é evidente) de que ver essa minha opinião refutada. O problema é que qualquer uma dessas proposições leva a um desencanto inevitável do mundo no que diz respeito à poesia do intelecto; o desencanto está tão intrinsicamente presente na posição atheia quanto na pantheísta na medida em que a arte implica uma noção de presença, e a compreensão da presença implica uma aparição, e em sítio algum ou momento algum da vida sou capaz de concretizar a tal nível a experiência do espelho a ponto de me poder tornar um espelho para mim mesmo: que eu seja divino de nada me serve, pois nessa divinização do tudo estou impedido de me presenciar a mim mesmo como divino. Ou melhor ainda, sou capaz de me presenciar a mim mesmo como divino, mas apenas no instante exstático e mýstico (o momento da compreensão do todo, do pan em pantheísmo), mas nesse instante deixa de haver um eu cuja divindade eu possa presenciar. Caímos no mesmo ponto. No que à poesia do intelecto diz respeito, portanto, tanto o atheísmo quanto o pantheísmo têm o mesmo resultado frustrado. Esta conclusão leva-me frequentemente e ponderar tomar a via æstheticista e completar o sacrificium intellectus. Seria certamente a via mais artisticamente estimulante; também a via mais chic, pois que raras vezes se leva a fé a sério para além do dandyismo. Mas de cada vez que o faço ouço retomba-me nos ouvidos a voz calma e severa daquele Sócrates de Chicago, mais a sua philosophia «sustained and elevated by eros, graced by nature's grace»: Volto atrás, consciente simultaneamente da heróicidade dos heróis anglo-saxónicos e da minha incapacidade para os atingir (incapacidade essa que, não obstante, são antes um argumento do que um contra-argumento para uma possível assimilação espiritual a eles; ver Leverkühn), e regresso à conclusão atingida pela razão criativa; por muito que não a mereça e fique aquém, pois de outro modo este passo seria um passo único e singular, e não algo iterativo, necessariamente penitente, arrependido, e regressado. Ainda assim, por estar lá sempre na minha fraqueza, por não se cansar de dizer as palavras, a um nível muito pessoal devo-lhe talvez tanto quando devo à Weil e ao Hölderlin, e isto é dizer muito. Tenho saudades de o ler e de o ouvir. Sofro por não o ter conhecido.

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