22/09/2013

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Sokrátes. E por meio de tudo isto parece-me que neste calor abrasador as cigarras cantam por cima das nossas cabeças e conversam entre si – e observam-nos. Se acaso soubessem que também nós somos como os outros, e que neste meio-dia uma tal preguiça de espírito se apossa de nós a ponto de não conversarmos e de nos deixarmos dormitar e seduzir pelo seu canto, sem dúvida que troçariam de nós, e fá-lo-iam com toda a justiça. Aliás, iriam tomar-nos por uns escravos quaisquer que vão ter com elas como se vai a uma pousada, iguais ao gado que passa o meio dia a dormir junto à fonte. Mas se derem por nós a conversar e a passar-lhes ao largo como passaríamos pelas Sereias sem lhes prestar caso, serão elas próprias a ficar deslumbradas e a conceder-nos sem hesitar o prémio que os deuses lhes permitem conceder.

Phædros. Mas afinal que prémio é esse? Não me parece que tenha alguma vez ouvido falar.

Sokrátes. Não fica bem a alguém que ama as Musas nunca ter ouvido falar desta história. Conta-se que [as cigarras] foram em tempos homens, dos que existiam antes de haver Musas. Quando estas nasceram, e quando com elas surgiu também o canto, alguns deles foram de tal forma arrebatados pelo prazer que lhes advinha enquanto cantavam que se esqueceram de comer e de beber, e morreram sem dar por isso. A raça das cigarras traça até eles a sua origem, e foi este o prémio que receberam das Musas: não precisarem de alimento algum, e perserverarem no canto sem comida nem bebida até morrerem, e reunirem-se depois disso com as Musas para lhes contarem quais dos que por cá andam as honraram [e a quais]. Contam a Terpsikhóre quem a honrou com danças, e a esses tornam-nos ainda mais amáveis. A Eratô cabem os que a honraram no amor, e assim por diante a cada uma de acordo com a homenagem que lhes é devida. Enumeram a Kalliópe, a mais velha, junto com a sua companheira Ouranía, quais foram os que passaram o seu tempo na filosofia e que desse modo as artes dessas Musas [τὴν εκείνων μουσικὴν] cultivaram. Pois de todo o círculo das Musas é a elas que cabe confiar a sua belíssima voz quer aos céus quer aos mais belos discursos que deuses e homens proferem. Isto parece-me então motivo bastante para conversarmos e para não nos deixarmos adormecer neste meio-dia.

Phædros. Falemos então.

Platão. Fedro. 258e-259d. Tradução de Miguel Monteiro Sena.


Fala-me, Musa, do homem astuto que tanto vagueou,
depois que de Tróia destrui a cidadela sagrada.
Muitos foram os povos cujas cidades observou,
cujos espíritos conheceu; e foram muitos no mar
os sofrimentos por que passou para salvar a vida,
para conseguir o retorno dos companheiros a suas casas.
Mas a eles, embora o quisesse, não logrou salvar.
Não, pereceram devido à sua loucura,
insensatos, que devoraram o gado sagrado de Hiperíon,
o Sol – e assim lhes negou o deus o dia do retorno.
Destas coisas fala-nos agora, ó deusa, filha de Zeus.
Homero. Odisseia. I.1-11. Tradução de Frederico Lourenço.


{ΣΩ.} Σχολὴ μὲν δή, ὡς έοικε· καὶ ἅμα μοι δοκοῦσιν ὡς εν τῷ πνίγει ὑπὲρ κεφαλῆς ἡμῶν οἱ τέττιγες ᾴδοντες καὶ αλλήλοις διαλεγόμενοι καθορᾶν καὶ ἡμᾶς. ει οῦν ίδοιεν καὶ νὼ καθάπερ τοὺς πολλοὺς εν μεσημβρίᾳ μὴ διαλεγομένους αλλὰ νυστάζοντας καὶ κηλουμένους ὑφ' αὑτῶν δι' αργίαν τῆς διανοίας, δικαίως ὰν καταγελῷεν, ἡγούμενοι ανδράποδ' άττα σφίσιν ελθόντα εις τὸ καταγώγιον ὥσπερ προβάτια μεσημβριάζοντα περὶ τὴν κρήνην εὕδειν· εὰν δὲ ὁρῶσι διαλεγομένους καὶ παραπλέοντάς σφας ὥσπερ Σειρῆνας ακηλήτους, ὃ γέρας παρὰ θεῶν έχουσιν ανθρώποις διδόναι, τάχ' ὰν δοῖεν αγασθέντες.

{ΦΑΙ.} Έχουσι δὲ δὴ τί τοῦτο; ανήκοος γάρ, ὡς έοικε, τυγχάνω ών.

{ΣΩ.} Ου μὲν δὴ πρέπει γε φιλόμουσον άνδρα τῶν τοιούτων ανήκοον εῖναι. λέγεται δ' ὥς ποτ' ῆσαν οὗτοι άνθρωποι τῶν πρὶν Μούσας γεγονέναι, γενομένων δὲ Μουσῶν καὶ φανείσης ῳδῆς οὕτως άρα τινὲς τῶν τότε εξεπλάγησαν ὑφ' ἡδονῆς, ὥστε ᾴδοντες ημέλησαν σίτων τε καὶ ποτῶν, καὶ έλαθον τελευτήσαντες αὑτούς· εξ ὧν τὸ τεττίγων γένος μετ' εκεῖνο φύεται, γέρας τοῦτο παρὰ Μουσῶν λαβόν, μηδὲν τροφῆς δεῖσθαι γενόμενον, αλλ' άσιτόν τε καὶ άποτον ευθὺς ᾴδειν, ἕως ὰν τελευτήσῃ, καὶ μετὰ ταῦτα ελθὸν παρὰ Μούσας απαγγέλλειν τίς τίνα αυτῶν τιμᾷ τῶν ενθάδε. Τερψιχόρᾳ μὲν οῦν τοὺς εν τοῖς χοροῖς τετιμηκότας αυτὴν απαγγέλλοντες ποιοῦσι προσφιλεστέρους, τῇ δὲ Ερατοῖ τοὺς εν τοῖς ερωτικοῖς, καὶ ταῖς άλλαις οὕτως, κατὰ τὸ εῖδος ἑκάστης τιμῆς· τῇ δὲ πρεσβυτάτῃ Καλλιόπῃ καὶ τῇ μετ' αυτὴν Ουρανίᾳ τοὺς εν φιλοσοφίᾳ διάγοντάς τε καὶ τιμῶντας τὴν εκείνων μουσικὴν αγγέλλουσιν, αἳ δὴ μάλιστα τῶν Μουσῶν περί τε ουρανὸν καὶ λόγους οῦσαι θείους τε καὶ ανθρωπίνους ἱᾶσιν καλλίστην φωνήν. πολλῶν δὴ οῦν ἕνεκα λεκτέον τι καὶ ου καθευδητέον εν τῇ μεσημβρίᾳ.

{ΦΑΙ.} Λεκτέον γὰρ οῦν.


Ὀδυσσείας τὸ φροίμιον

Άνδρα μοι έννεπε, Μοῦσα, πολύτροπον, ὃς μάλα πολλὰ
πλάγχθη, επεὶ Τροίης ἱερὸν πτολίεθρον έπερσε·
πολλῶν δ' ανθρώπων ίδεν άστεα καὶ νόον έγνω,
πολλὰ δ' ὅ γ' εν πόντῳ πάθεν άλγεα ὃν κατὰ θυμόν,
αρνύμενος ἥν τε ψυχὴν καὶ νόστον ἑταίρων.
αλλ' ουδ' ὧς ἑτάρους ερρύσατο, ἱέμενός περ·
αυτῶν γὰρ σφετέρῃσιν ατασθαλίῃσιν όλοντο,
νήπιοι, οἳ κατὰ βοῦς Ὑπερίονος Ηελίοιο
ήσθιον· αυτὰρ ὁ τοῖσιν αφείλετο νόστιμον ῆμαρ.
τῶν ἁμόθεν γε, θεά, θύγατερ Διός, ειπὲ καὶ ἡμῖν.

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