A Itália é famosa pelo uso abundante da linguagem gestual, por um acompanhamento quase indispensável da palavra falada por parte da linguagem não falada, da linguagem vista, das mãos que acompanham o ritmo, a emoção e o sentido do que nesse momento está dito. Chega-se até a ver livros de "expansão ao dicionário" que contém os abundantes signos, livros esses que, raiando por certo o humorístico não deixam de ter um certo je ne sais quoi de verdade.
A dialéctica Atenas-Jerusalém fundiu-se, não obstante o famoso grito de revolta de Tertuliano, "Mas o que é que Atenas tem que ver com Jerusalém?!", no império Romano, e por consequência manteve, e mantém creio poder dizer até hoje, a cidade de Roma como um misto sobre-reciclado das duas tradições, pagã ou filohelénica, como centro dum império de deuses, e Judaico-Cristã, como lugar do martírio de Pedro e lugar do trono papal durante séculos.
A mística hebraica é uma de som e de voz, de revelação enquanto palavra, que deve ser entendida como união inseparável de letra e do seu som correspondente. Deus cria as letras, imprime nelas toda a vida de toda a criação possível, e só então mais tarde se pode falar do Seu "Fiat Lux!"- o som vem antes da sequer possibilidade de imagem. Na mística grega, concretamente pegando no exemplo de Platão, é o oposto: a revelação do divino faz-se através do silêncio (ou pelo menos do som como meramente contingente), no momento da contemplação última do Sol, verdadeiro e Belo atingido por fim e assimilado através do momento noético em que se vê a Verdade.
As duas tradições são inerentemente contraditórias. Mas a Itália, e Roma em concreto, com o que a cidade simboliza, tentou por muito tempo concretizar uma união: daí a Europa gerou a Idade Média e o seu Fides et Ratio, daí o comentário do compositor Giacinto Scelsi, "Roma é a fronteira entre Este e Oste. No Sul de Roma, começa o Este, a Norte de Roma, começa o Oeste. A divisão passa exactamente pelo Fórum Romano. Aí fica a minha casa: Isto explica a minha vida e a minha música", daí também a classificação de George Steiner da "herança repartida de Atenas e Jerusalém" como um dos elementos fundadores da Ideia de Europa.
Roma sempre a entendi como a materialização dessa união. Há duas razões extremas para cá vir: para se estar com os pagãos ou para se estar com os cristãos, mas ninguém se fica por apenas um dos lados. E portanto será talvez uma consequência histórico-linguística deveras apropriada que o italiano seja uma língua conhecida por essa mesma linguagem gestual sempre paralela. Como se até no viver da língua estivessem presentes as duas tradições místicas fundentes, ouvir a língua, ver a língua, Φῶς καὶ Φωνή, Lux et Vox.
Sem comentários:
Enviar um comentário