01/03/2012

Rhodos

a educação da cidade anuncia
a sua impotência – um povo estrangeiro
oferece-se como metáfora. Athenas
matricida, sofremos tanto contigo
quanto tu connosco? rerum divinarum cognitio
seguida dum intervalo entre parlamentações. note-se
que os trobadores chegavam cantar três
senhores, cada um com a sua exigência
ch'è chiamata amore, isto é
o um só olho de Hermes, que Dantes devorou
sem desejo, sem misericórdia, sem saber
de quem. se te chamo assim então, senhor,
Lady of the Rocks, como o véu ἀκουσματικῶν
geometricamente ordenado pelo teu retrato pintado
na Florença que arde filosoficamente
a bom arder e que naufraga o pensamento – se minto
e não me confesso, quer isso então dizer
que Platão estava errado? e que tal
Alfarabi? também eles largavam
escárnios como nós derramamos sangue
suspenso em estalactites, ou como o tempo que contrai
os nossos ofícios civis, ou os prolonga enquanto esperamos o escurecer
das luzes municipais, da estrela
vespertina. não creio que as volte a adorar assim,
não tanto quanto a ti, ociosa máscara,
por muito que na minha palma segure em vez de ti o deus
que me arranca a cabeça com uma prece
λάθε ἐρασθείς, que quer dizer eu amo-te como um imperador
ama abdicar, ou como quando os monges irlandeses
trocavam nos poemas palavras por outras mais rebuscadas
em busca daquela dificuldade que ama aldrabar
e que ama ainda mais amar. dizem que muitas ilhas mediterrâneas
são inexpugnáveis. dizem ainda nunca construas muralhas
dentro doutras muralhas. quando astrónomos recentemente
indagaram Andrómeda celebraram
porque por uma só noite tinha desaparecido do céu
como um romance do Saramago para alquimistas
mas ao chegar a casa, trocaram finalmente a alegria
pela liberdade, perceberam
que quando um sonho morre outro toma sempre o seu lugar
nas almas dos teus inimigos. não te entristeças
virá o dia em que nem os alexandrinos
nem a etymologia, a ciência do vero,
estarão disponíveis para ti. a alvorada
em Rhodes, a fraqueza que expulsas
para a tornares mais tua, tudo isso existe já
desde a origem, aquele frágil vidro que nos golpeia em segredo
como crianças, e que eu estilhaço contra a rocha.


Miguel Monteiro

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