10/05/2013

Little Genesis

A literatura não salvará o mundo, nunca salvou nem aparenta que se imagine numa direcção que sequer tome consciência dessa possível tarefa (pace as anelações da crítica). Nem sequer a filosofia salvará o mundo, por grandes que as suas promessas e esperanças. Só Deus salvará o mundo, problema daí sendo porque Deus não há. Se Deus não hábet, nada é permitido, nem sequer salvar o mundo. Deus foi a liberdade, foi os caminhos. Sem ele isso tudo se faz pó de vidro. Aut inveniam Deum aut faciam. Que Deus também era Amor, e Deus deu-nos esse Amor, e nós ainda o temos. Perdemos o Criador mas temos ainda a Criação. Deus faz-se. Já não o procuramos para o encontrarmos mas para o criarmos. Deus é Amor, Amor é Deus, isso já Platão sabia. Mas o que Platão não sabia era que os deuses também podiam morrer (isso só o Psicopompo soube), e que por isso quando amamos e criamos é preciso amar outra vez para voltarmos a criar. Revela-se-nos o Amor como infinitas criações, infinitos & profanos Géneseis. É a gratidão da criatura que cria o criador (Vorspiel auf dem Theater). É isto que a Orthodoxia Grega percebeu melhor que todos: percebeu que a maior das lôdas é à Theotókos, é à Mãe de Deus: que é aí que está a salvação. Porque Maria dá luz a um Deus que não estava lá antes. Dar à luz Deus é necessário, caso contrário Deus continuará a não existir, e continuará para sempre a não existir. É isto que compreendemos pela mýstika do Eckhart, o do «Pai permanentemente a dar à luz o Filho, e o Filho eternamente a nascer do pai». A Imitatio Christi, Imitatio Dei corrigiria eu, é dar à luz Deus onde Ele antes não havia — a saber, por todo o lado, porque Deus não existe em lado nenhum. Talvez isto seja, como dizia o Nietzsche, por Ele ter morrido, mas eu estou cá por mim que a anthropologia tem mais de verdade: foi a Humanidade que pela primeira vez inventou os Deuses, e que se nossos ancestrais pais e mães não os tivessem inventado, jamais teria havido Palavra fosse de que género fosse: abençoados eles! Mas o Amor é doloroso: Deus sofreu, e nós sofremos também. Sofremos por amarmos, que as dores d'Amor são em nós simultaneamente a Paixão da Cruz do Christo e as dores de parto de Maria. Umas e as mesmas, e valem a pena porque recriam a Criação a cada instante, permitem que novos mundos nasçam, e porque o nosso Amor libertam. Palavra da salvação.

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